“Não é estagnar o desenvolvimento tecnológico ou as novas formas de trabalho (Uberização), mas garantir que estas não sejam ponta de lança da exploração do trabalhador” (Leonardo Sakamato)
Presidente da AMATRA XV acompanhou palestra do jornalista e todos os Painéis de Simpósio, promovido pela EJUD do TRT-15.
A fiscalização da Inspeção do Trabalho resgatou 1.133 pessoas de um total de 1.723 trabalhadores encontrados em condições análogas às de escravidão em 2018, segundo balanço feito pela Inspeção do Trabalho da Secretaria de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia. A maior parte desses trabalhadores (1,2 mil) estava em áreas rurais, onde a prática é mais comum.
Em todo o ano de 2018, foram realizadas 231 ações fiscais, sendo 116 pelos Grupos Especiais e 115 pelas unidades regionais.
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Diante deste panorama foi realizado, no último dia 11, o Simpósio “Trabalho Escravo Contemporâneo”, no auditório do Plenário Ministro Coqueijo Costa, no edifício-sede da Corte, em Campinas, promovido pela Escola Judicial – EJUD do TRT/15.ª Região, em parceria com Comitê Regional de Erradicação do Trabalho Escravo, Tráfico de Pessoas e Discriminação da 15.ª Região.
A Escola Associativa dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 15.ª Região – ESMAT 15 prestou apoio institucional ao evento.
O Presidente da AMATRA XV e Diretor-Geral da ESMAT 15, Juiz César Reinaldo Offa Basile, acompanhou todos os Painéis do Simpósio:
- Trabalho Escravo e Discriminação: Trajetória e Atualidade. Professor Ricardo Rezende Figueira, Doutor em Sociologia e Antropologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com Pós-Doutorado pelo Instituto de Derechos Humanos Bartolomé de las Casas da Universidad Carlos III de Madrid.
- Trabalho Escravo no Sistema Produtivo. Jornalista Leonardo Moretti Sakamoto, fundador da Organização Não Governamental Repórter Brasil. Formado pela Universidade de São Paulo (USP), com Mestrado e Doutorado em Ciência Política, e, entre outras atividades, faz parte do Liechtenstein Initiative, um projeto conjunto dos governos de Liechtenstein, Austrália, Holanda, do Secretariado nas Nações Unidas e de instituições e fundações privadas do setor financeiro global contra a escravidão moderna e o tráfico de pessoas. A mesa foi presidida pela Desembargadora Eleonora Bordini Coca, integrante do Comitê de Erradicação do Trabalho Escravo, Tráfico de Pessoas e Discriminação do Tribunal.
- Controle de Convencionalidade e os Direitos Fundamentais. Platon Teixeira de Azevedo Neto (Mesa-Redonda), Juiz Titular da Vara do Trabalho de São Luís de Montes Belos (TRT da 18.ª Região – Goiás), e Guilherme Guimarães Feliciano, Juiz Titular da 1.ª Vara do Trabalho de Taubaté, ex-Presidente da ANAMATRA e AMATRA XV.
Autoridades Presentes
O Desembargador Eduardo Benedito de Oliveira Zanella, Presidente do Comitê Regional de Erradicação do Trabalho Escravo, Tráfico de Pessoas e Discriminação da 15.ª Região, conduziu a cerimônia de abertura, que contou também com a presença dos Desembargadores Carlos Alberto Bosco, Vice-Diretor da EJUD 15, e Lorival Ferreira dos Santos, Presidente da Corte no Biênio 2.014/2.016 e representando, no ato, a Presidência da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB).
Ainda na Mesa Alta, tomaram assento o Vereador Carlão do PT, Presidente da Comissão Permanente de Direitos Humanos da Câmara Municipal de Campinas, e representando no ato a Presidência do Poder Legislativo local; o Juiz Leonardo Wandeli, representando a Presidência do TRT/9.ª Região (PR); o Juiz Farley Roberto Ferreira, Presidente da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 2.ª Região – AMATRA II e representando no ato a Associação Nacional da Magistratura Trabalhista – ANAMATRA; Sandro Rogério Batista Lopes, Vice-Presidente da Comissão Especial de Relacionamento da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo com o TRT/15.ª Região, representando no ato o Presidente daquela seccional, Caio Augusto Silva dos Santos; e Ademir José da Silva, representante da OAB/Campinas, além do Juiz César Reinaldo Offa Basile.
Ao final do Simpósio, o Presidente da AMATRA XV sintetizou: “Enriquecedor e necessário diante desta ferida, que mesmo na contemporaneidade, se encontra aberta. Vale ressaltar que a EJUD-15 sempre contará com presença de nossa escola de Magistrados, a ESMAT 15,em seu eventos”.
Bastidores – Entrevista de Leonardo Sakamoto
Leonardo Sakamoto foi o segundo palestrante. Um pouco antes da sua exposição, concedeu entrevista à imprensa local e à Assessoria de Imprensa da AMATRA XV. Acompanhe:
O Brasil continua resgatando trabalhadores em situação análoga de escravos e garantido seus direitos mesmo com a mudança do comando político. Acontece que a Política de Combate ao Trabalho Escravo é uma questão de Política de Estado e não de Governo no Brasil, começando com Fernando Henrique Cardoso e ela tem sobrevivido apesar dos percalços políticos.
“A sociedade não é permissiva com
relação ao Trabalho Escravo, mas
a economia é…”
Apesar de governos, que já criticaram o Trabalho Escravo, não concordando com alguns conceitos, estes são um dos pontos que a sociedade tem mostrado que não abre mão. A sociedade brasileira tem mostrado que isso não é negociável. Com o ex-Presidente Michel Temer tivemos alguns problemas na forma de resgatar os trabalhadores e ele teve que aceitar o fato de que as Instituições Brasileiras, têm defendido, de uma forma muito firme, o combate à escravidão. Por enquanto, não sabemos até quando, mas o Brasil continua e continuará o combate ao trabalho escravo.
A sociedade não é permissiva com relação ao Trabalho Escravo, mas a economia é, pois acha que precisa se beneficiar direta ou indiretamente do trabalho escravo análogo. Não é necessário se beneficiar disto na contemporaneidade. Definitivamente, este trabalho, não é fundamental para a manutenção da economia.
Encontramos trabalho análogo escravo em atividades que são periféricas ou nas fazendas rurais, em empreendimentos que são atrasados e acabam, ao invés de investirem em tecnologia ou qualidade de vida do trabalhador, acabam tendo menos recurso para investir, depreciando o custo de vida do trabalhador.
O Trabalho Escravo acaba sendo utilizado pelos empreendimentos econômicos ou para aumentar a sua competividade, a sua margem de lucro num mundo globalizado.
Ele não é resquício deixado no final do século XVIII com a Erradicação da Escravidão com a Lei Aurea. Entretanto, o Trabalho Escravo tem sido um instrumento econômico, não só no Brasil. Eu faço parte de dois Conselhos das Nações Unidas e vemos que, mundialmente, acontece a mesma coisa, seja na pesca, na Tailândia, na Costa Africana com exploração de minerais, nas fazendas de milho nos EUA, nas confecções em Bangladesh, no Sudoeste Asiático, sendo usado sistematicamente para aumentar a competitividade.
“Ele não é resquício
deixado no final do século XVIII
com a Erradicação da Escravidão
com a Lei Aurea…”
Desde 1995 mais de 54 mil trabalhadores brasileiros foram resgatados. Eles atuavam, principalmente, na pecuária bovina, mas estavam também na produção de soja, de algodão, feijão, arroz, frutas, batata, cebola, no desmatamento com a produção de madeira e reflorestamento, no caso de pinus.
“Houve Trabalho Escravo nas obras do Minha Casa, Minha Vida
e CDHU tanto na Gestão do PT e PSDB,
provando que o Trabalho Escravo
não escolhe partido”
Não só na produção rural, mas encontramos na construção civil. No caso das hidroelétricas, encontramos prostíbulos. Houve Trabalho Escravo nas obras do “Minha Casa, Minha Vida ou CDHU tanto na Gestão do PT ou PSDB, provando que o Trabalho Escravo não escolhe partido. Por falta de controle, ele ocorreu nos dois programas.
Nas confecções em São Paulo, há uma incidência muito grande do trabalhador latino; peruanos, paraguaios e bolivianos. Aqui, no interior de SP, inclusive na Região do TRT 15, grandes marcas foram localizadas, promovendo este tipo de trabalho ilegal.
No Rio de Janeiro, chineses foram libertados em restaurantes e lanchonetes. Nesta operação, você se depara com boates e encontra o Trabalho Sexual Escravo, também encontrado nas beiras da rodovia. Crianças om 12, 13 e 14 anos são escravizadas por cafetões.
Uberização
Existe uma discussão acadêmica e jurídica muito forte sobre Uberizacão. Há explorações dentro das plataformas, porém sempre depende de caso a caso. Por exemplo, para avaliar se há Trabalho Escravo, por vezes terceirizado, em uma fazenda é necessário ver todos os elementos.
Fora do Brasil, já têm pessoas que tentam fazer esta vinculação. Estamos caminhando sobre uma responsabilização trabalhista e há discussões sobre casos muito gritantes desta exploração.
Um dos grandes erros da Reforma Trabalhista, na época do Governo Temer foi a ideia de atualização. A ideia era uma modernização das regras que regem as relações de compra e venda da mão de obra. O que era esperado e seria ótimo. O grande problema foi que se modernizar gerou uma desregulamentação de processos. Precisávamos de um Estado regulando estas novas formas de relações entre patrões e empregos.
Não é estagnar o desenvolvimento tecnológicos ou as novas formas de trabalho, mas é garantir que estas novas formas não sejam ponta de lança da exploração do trabalhador.
Então, quais são os limites? Há uma relação de emprego? De quais condições? Os legisladores deveriam o ter se debruçado sobre isso.
Temos um caso no Estado de São Paulo, em que um trabalhador de aplicativos morreu. Ele foi fazer uma entrega e que foi atropelado. Ligaram para empresa e esta pediu para que dessem baixa no pedido para que as outras pessoas não ficassem esperando. Para prestar o socorro, chamaram um Uber para levá-lo ao hospital e ele se negou. Ou seja, uma tragédia com tantos elementos. (Clique para ler a notícia)
As regulamentações trabalhistas têm limites, mas no caso destas plataformas, não tem nenhum. Vira uma “Terra sem lei” Isso é ruim não só para o trabalhador, mas para o empregador, porque as Leis Trabalhistas servem para que seja equilibrada esta relação entre empregado x empregador.